terça-feira, 16 de novembro de 2010

SALVADOR E EU

 A vida toda planejei minha viagem a Salvador. Desisti algumas vezes depois de hotel parcialmente pago, voos reservados e até abadás comprados para o carnaval. Enfim, esse ano, 2010, tudo saiu como deveria e nas vésperas do meu aniversário de 26 anos eu etava na "cidade Maravilhosa" - a minha, com licença do Rio de Janeiro.

Me emocionei. Cada beco da cidade me dava vontade de chorar. Tentei explicar diversas vezes, mas acho que o que acontecia era tão Meu que não dava pra partilhar. A minha sensação era de reencontro, de volta. Era como se eu conhecesse aquela cidade. E eu realmente conhecia, pelos meus estudos, pelas músicas pelo candomblé... Eu ja partilhava do cotidiano de Salvador mesmo nao estando lá, mas ainda nao era isso que explicaria minha sensação.

Quando caminhavamos pelo orla, eu, em cada esquina, li as placas de indicação dos nomes das ruas e avenidas, e cada uma delas estava no meu imaginário. No centro histórico, eu conhecia cada canto. O cheiro do dendê, do camarão, do quiabo e do coco eram cheiro de casa - apesar de que nunca estiveram presentes na história culinária da minha família. Em duas horas eu ja falava com o sotaque manso e cadenciado dos bahianos. Meu amigos ate se sentiam irritados, quase me deixaram lá! alias, deveriam ter deixado. É minha origem.

Em outra oportunidade escreverei sobre a visita aos candomblés, mas posso dizer que achei "minha turma". A brisa do mar de Salvador é única. As baianas do acarajé, patrimônio histórico e sagrado. Cada banho de mar parecia um batismo. Que riqueza. Como fui feliz na Praia do Forte, no belíssimo Farol da Barra, caminhando pela Ondina, na Boca do Rio, Na Itapoã de vinicius e Caymmi. Sinto falta de cada pedra que pisei naquelas vielas. A alegria da Bahia é a essência da alegria do brasileiro. Pedindo licença ao poeta: "se você não foi à Bahia, então vá".

sábado, 13 de novembro de 2010

ESTEREÓTIPOS CULTURAIS E HERANÇA NEGRA

Interessante como só conseguimos conceber o outro através de estereótipos - que segundo o dicionário é o modo de estabelecermos definições sobre pessoas através de caracteres externos. Em minha última visita a Salvador, ouvindo comentários de alguns amigos que me acompanhavam, me pus a obervar o comportamento das baianas e dos turistas na relação morador local x visitante curioso.
As baianas, sempre com suas saias rodadas, turbantes e colares de contas, cores e tecidos que representam diretamente suas divindades de "cabeça", formam um "cordão" de "alegorias" à disposição dos turista - digo cordão porque ainda existem muitas outras "alegorias" em destaque. Algumas das baianas cobram para serem fotografadas, outras vendem artesanato, se apresentam como guias, vendem comidas típicas, mas quase sempre em busca de alguma "ajuda". Entendo que a economia local seja quase que totalmente dependente do dinheiro que as pessoas de todas as partes do mundo deixam por lá, entendo que cada um faz o que pode para sobreviver, so me preocupa que esse uso dos costumes locais nao faça desse "teatro" uma artificialização da cultura de matriz africana.
Fato parecido acontece nas escolas. Sempre que se representa a cultura afro-brasileira, faz-se de maneira longínqua, impessoal, como se tudo isso fosse parte de um pedaço da histórica que ficou no tempo, ou que está geograficamente muito bem demarcada e delimitada. O importante é não fantasiarmos os aspectos da cultura como se ela nao estivesse presente nas nossas ações do dia-a-dia, na culinária, na moda, na música, no nosso modo de pensar, de manipular as ervas, de rezar, contar histórias... O que ser quer, hoje, para vencermos o processo de subjulgamento das etnias representadas no Brasil, é mostrar como a nossa nação é mista, heterogênea e multicultural. Quando se fala em "consciência" pretende-se que as pessoas sejam cientes de que nosso modo de vida é herdeiro dos costumes africanos e que isso nao faz da nossa nação inferior a nenhuma outra, muito ao contrário, isso representa uma riqueza pouco vista em outras partes do globo.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

SEMANA DA CONSCIÊNCIA NEGRA, NÃO DIA DO NEGRO

Em minhas andaças pelo estado de Goiás, falando sobre a importância da cultura negra na formação da cultura nacional, tenho percebido um maior interesse pela temática africanista, no entanto esse interesse pouco tem gerado ações que transformem o pensamento social. Chamo de ações qualquer atitude efetiva de ruptura com os estereótipos veiculados desde sempre sobre a raça negra.

As políticas afirmativas têm ganhado espaço nas discussões sociais nos mais diversos âmbitos. A agenda nacional tem contemplado amplamente a resignificação das manifestações da cultura de matriz africana, mas as microações, aquela mudança de postura que se espera das pessoas frente a multiculturalização do país ainda está longe de ser a que esperamos para tornar o Brasil racialmente mais democrático.

A Semana da Consciência Negra não é o dia do negro. A cultura indígena, massacrada pelo processo de colonização brutal pelo qual passamos, hoje só encontra espaço no folclórico, mítico, fantasioso. O próprio Índio se tornou um personagem que mora no imaginário das crianças que todos os anos comemoram o dia do índio na escola fazendo cocás, colares de semente, arco-e-flecha e pintando a pelo com guache, enquanto o Brasil ainda conta com cerca de 358.000 índios, reais, pessoas que estão em algum lugar nos rincões do país, inseridos na sociedade ou ainda em suas tribos. Os índios nao desapareceram, apesar de ja tratarmos o caso assim!

Tratar a cultura negra como algo distante, folclórico, fantasioso, mítico, é o primeiro passo para que essa cultura se acomode nesse lugar. So nao acredito que o Negro se tornará um personagem de histórias, como os índios, porque afinal, quem não é Negro no Brasil?

O papel da Semana da Consciência Negra é fazer com que a sociedade tenha "consciência" de que todos somos herdeiros da cultura de matriz africana. Isso é fato e independe de nossa aceitação. Ao planejar algum festejo para essa importantíssima semana, pense que ela não é simplesmente uma data colocada ao acaso no calendário, mas primordialmente uma forma de tomar posse de uma identidade que nao pode mais ser negada. Nossa ancestralidade é de cultura africana e temos de ter "consciência" e orgulho disso.